sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Leishmaniose Visceral em Centros Urbanos

Extenso trabalho sobre o tema elaborado pela Associação Bichos Gerais (BH).

Associação Bichos Gerais
Presidente: Helenice Machado Mendes Rutkowski
Diretor Técnico: Leonardo Maciel Andrade
Belo Horizonte
Março / 2006

1. APRESENTAÇÃO

 
A Associação Bichos Gerais (ABG) é uma organização não governamental sem fins lucrativos, com sede e foro em Belo Horizonte e que atua há vários anos em projetos que propiciem uma melhor convivência entre o ser humano e os animais, com reflexos diretos na área da saúde pública. O trabalho da ABG é reconhecido internacionalmente através da WSPA (Word Society for the Protection of Animals) e através de relatórios enviados aos conselhos regionais de medicina veterinária.

Dentre suas atividades, citam-se educação de crianças e adultos quanto à posse responsável de animais domésticos, projetos de lei, e, sobretudo atua no controle de Zoonoses através da esterilização cirúrgica de cães e gatos. Recentemente foi inaugurada sua segunda unidade (centro cirúrgico) para esterilização de animais à população de baixa renda, já tendo realizado centenas de cirurgias.

Atualmente, a ABG inicia parceria com o centro de controle de zoonoses de Belo Horizonte, com intuito de aumentar o número de castrações a serem realizadas, haja visto o comprovado benefício que a esta ação traz à saúde pública.

A ABG possui composição eclética, tendo em seu quadro, veterinários, médicos, engenheiros, advogados e pessoas leigas, estando em vias de tornar-se entidade de utilidade pública.

A ABG vem, através deste documento apresentar seu repúdio ao projeto de lei que institui a obrigatoriedade da execução sumária de cães em Belo Horizonte, sobretudo pelos malefícios que esta ação trará à saúde pública com relação à epidemia de leishmaniose visceral. A ABG apresenta uma compilação de dados e pesquisas científicas nacionais e internacionais através da qual pretende incitar uma discussão sobre o tema. 
 

2. INTRODUÇÃO


O tratamento, ou seja, a manutenção da vida do cão portador de leishmaniose tem sido alvo de calorosas discussões e a execução sumária de cães portadores tem sido bastante questionada em vários países inclusive no Brasil.

Em nosso meio, o cão desempenha importante papel social, seja como guarda numa sociedade cada vez mais violenta, apoio para o bem estar psíquico do proprietário, guia de pessoas com deficiência, farejador de tóxicos ou explosivos, entre tantas outras funções.

Possuir um ou vários cães em casa é hoje um aspecto cultural. Esse fato deve ser respeitado, pela impossibilidade de mantermos uma sociedade ocidental sem cães e pelo fato da leishmaniose ser endêmica. A convivência pacífica com a espécie canina é atualmente uma questão de saúde pública.

O cão em nossa cultura, não é tratado como se fosse um membro da família, na verdade muitas vezes ele o é efetivamente, inclusive com repercussões na área jurídica. Recentemente, em caso de dissolução de matrimônio, vemos a questão de posse de um cão, como a posse de um filho, ser motivo de ações judiciais em vara de família.

A morte ou a perda de um cão tem levado a distúrbios psicológicos nas pessoas que o amaram e cuidaram, como atesta o trabalho desenvolvido pelo psiquiatra Fernando Volpi e reproduzido na íntegra no anexo 1.

É o que chamamos luto canino, e que após a expansão da leishmaniose vem causando sofrimento em nossa sociedade. Não são somente as pessoas que sofrem com a epidemia, nossos cães também estão sofrendo com a doença, surgindo assim a necessidade de reavaliação dos métodos de controle para que se tornem mais eficientes e sobretudo mais éticos.

Observamos pesquisas intensas em todos os continentes afetados, tanto quanto aos métodos de controle, tratamento humano e canino, vacinas humanas e caninas.

A execução sumária1 de cães soropositivos é uma estratégia que tem levado, além do descontrole da doença a prejuízos emocionais irreparáveis e também prejuízos econômicos.

No terceiro congresso mundial em leishmanioses, Itália, 2005, trabalhos científicos confirmam a ineficácia do método, como por exemplo, a publicação brasileira de PEREIRA et al com o título: "The elimination of soropositive dogs is an ineficient measury for controlling the canine Leishmania (L.) chagasi infection". Este e outros trabalhos serão discutidos.

Infelizmente nossos cães têm atuado como reservatório da doença no meio urbano, ou seja, apesar de não transmitirem diretamente a doença ao ser humano ou a outros cães, podem guardar o parasito na pele e serem fonte de infecção para o mosquito vetor.

A ABG pretende incitar uma discussão sobre a questão da leishmaniose em nossa sociedade, sobretudo no meio urbano. A metodologia atualmente utilizada, e que data de mais meio século, vê-se impotente com o desenvolvimento das grandes cidades e o crescimento da doença. De acordo com a publicação no jornal Estado de Minas, 25 de março de 2001, em 1992 haviam 22 cidades acometidas e em 2000 este número subiu para 49; em 1992 haviam sido notificados 96 casos humanos e em 2000 este número subiu para 205, ou seja, a doença está em franca expansão.

Necessitamos urgentemente de um diálogo e um consenso entre todos os profissionais da área de saúde e organizações não governamentais com o objetivo principal de melhorar as condições de saúde no tocante às zoonoses, principalmente em um país com tantas condições sócio econômicas desfavoráveis como as nossas.  

1- Execução sumária: morte de um cão sadio clinicamente e que ainda poderia estar vivo por muitos anos.
Eutanásia: morte por piedade através de processos indolores, em caso de sofrimento irreversível.
Sacrifício: morte de um cão saudável, por processos indolores, por apresentar riscos ao ser humano.
 

3. Objetivo


Propor uma reavaliação da metodologia atualmente utilizada no controle da leishmaniose visceral visando:

            1 – diminuir a população canina na área urbana endêmica, considerando o cão como reservatório da doença.

            2 – otimizar a retirada de cães sororreagentes adotando parâmetros de infectividade para que seja evitada a reposição de cães não infectivos, por cães potencialmente infectivos.

            3 – propor a discussão de um programa de controle de zoonoses dentro de padrões éticos e morais, permitindo que a população que financia e mantém órgãos públicos e de pesquisa, possa desfrutar dos avanços da medicina, uma vez que a preservação da vida do cão portador de leishmaniose é possível.

            4 – propor a discussão de ações que realmente diminuam a incidência de leishmaniose canina e humana.
 

4. Informações gerais sobre a leishmaniose visceral, breve histórico da doença          no Brasil, e informações básicas sobre a biologia do vetor


O termo sânscrito "kala-azar", que significa febre negra, foi aplicado por médicos indianos a uma velha doença mais tarde definida como leishmaniose visceral (LV), que se caracterizava por debilidade geral, acessos de febre irregulares e repetitivos, anemia severa, atrofia muscular e aumento de volume do baço. Em 1903, Leishman identificou no baço de um soldado inglês que morreu de febre DUM DUM na Índia, certos microorganismos que considerou tripanossomos.

Alguns meses mais tarde, Donovan descreveu-os como agentes novos, numa amostra de punção no baço de uma criança. A sua característica histológica era a presença de um núcleo e de uma estrutura em forma de bastão, chamada cinetoplasto. A relação entre kala-azar e o parasito foi descoberta neste mesmo ano por Ross, que o denominou Leishmania donovani, criando o gênero Leishmania.

A Leishmaniose não é uma doença única, mas um conjunto de síndromes complexas e multifacetadas causadas por diversas espécies do gênero Leishmania, transmitida por insetos vetores (Flebotomíneos), que afetam tanto seres humanos como animais domésticos e silvestres, e que estão distribuídas em todos os continentes, com exceção da Oceania e Antártida (Cardoso e Cabral 2000).

A expressão da doença é variável e reflete as complexas interações da virulência da espécie ou estirpe infectante com a resposta imunitária do hospedeiro (WHO, 1990; Pearson, 1993). O resultado revela-se em um espectro de efeitos que podem variar de uma infecção assintomática ou sub-clínica, passando por lesões cutâneas localizadas e destruição tardia de membranas mucosas, até ao envolvimento generalizado do sistema mononuclear fagocitário (Sacks et al, 1993; Pearson e Sousa, 1996).

No homem, verificam-se três síndromes principais: Leishmaniose cutânea (LC), leishmaniose muco-cutânea (LMC), leishmaniose visceral (LV).

A leishmaniose cutânea se caracteriza por formação de úlceras na pele, que podem curar-se espontaneamente ou evoluir para lesões crônicas; a leishmaniose muco-cutânea se caracteriza por acometimento das mucosas do trato respiratório superior, tecidos moles e cartilagem nasofaríngea. A forma visceral da doença afeta vários órgãos, incluindo o baço, a medula óssea, o fígado, gânglios linfáticos e pele (Kemp et al, 1996).

Segundo o manual de vigilância e controle de leishmaniose visceral do ministério da saúde, Brasília, 2003, a doença, dado sua incidência e letalidade em crianças desnutridas e indivíduos não tratados é também considerada emergente em pacientes portadores de infecções pelo vírus da AIDS, tornando-se uma das doenças mais importantes da atualidade. Desde o inicio do século passado, a doença vem sido descrita em vários municípios de todas as regiões do Brasil. A doença vem apresentando mudanças importantes no padrão de transmissão, inicialmente predominando pelas características de ambiente rural e peri-urbano, e mais recentemente em centros urbanos como Rio de Janeiro (RJ), Corumbá (MS), Belo Horizonte (MG), Araçatuba (SP), Palmas (TO), Três Lagoas (MS), Campo Grande (MS) entre outros. Até o ano de 2003, a doença estava registrada em 19 das 27 unidades da federação, atingindo aproximadamente 1600 municípios.

Ainda segundo o Ministério da Saúde, nos últimos dois anos a incidência humana tem sido de dois casos para cada cem mil habitantes. As estratégias de controle até então utilizadas, estavam centradas e dirigidas verticalmente para o controle do reservatório canino (inquérito sorológico canino e eutanásia de todos os cães sororreagentes), bem como aplicação de inseticida, diagnóstico e tratamento dos casos humanos registrados. O órgão admite, entretanto, que estas medidas, muitas vezes realizadas de forma isolada, não apresentam efetividade para redução da incidência da doença, determinando a necessidade de reavaliação das ações propostas pelo programa de controle de leishmaniose visceral. A doença encontra-se em franca expansão pelo país, e o novo enfoque é o de incorporar os Estados e municípios silenciosos, ou seja, sem ocorrência de casos humanos ou caninos da doença, nas ações de vigilância, visando assim evitar ou minimizar os problemas referentes a este agravo em áreas sem transmissão. Nas áreas com transmissão de leishmaniose visceral, após estratificação epidemiológica, as medidas de controle serão distintas e adequadas para cada região a ser trabalhada, entretanto, é de fundamental importância que as medidas usualmente empregadas no controle da doença sejam realizadas de forma integrada, para que possam ser efetivas.

O cão é considerado o principal reservatório da doença no meio urbano, apresentando muitas vezes um quadro clinico de difícil diagnóstico para o médico veterinário. Segundo NOLI (1999), vários órgãos do cão podem ser afetados podendo os sintomas aparecerem isolados ou múltiplos, tais como: debilidade, diminuição de atividade física, problemas na pele, perda de peso, atrofia muscular, anorexia, anemia, poliartrite, insuficiência renal crônica, miosite, lesões ósseas, hepatite, colite ulcerativa crônica com diarréia, pancreatite,   linfadenopatia, conjuntivite, glaucoma e outros.

Os vetores da leishmaniose visceral são insetos denominados flebotomíneos, conhecidos popularmente como mosquito palha. No Brasil, duas espécies até o momento estão relacionadas com a transmissão da doença: Lutzomyia longipalpis e Lutzomyia cruzi. A primeira espécie é considerada a transmissora de Leishmania (L.) chagasi no Brasil e, recentemente, Lutzomyia cruzi  foi incriminada como vetor no Estado do Mato Grosso do Sul.

No Brasil, a distribuição geográfica do mosquito vetor é ampla e parece estar em expansão. Nas regiões norte e nordeste, a lutzomyia longipalpis era encontrada nas matas participando do ciclo primário de transmissão da doença. Progressivamente houve adaptação deste inseto ao ambiente rural e recentemente ao final da década de oitenta, verificou-se sua presença nos ambientes urbanos, e suas periferias, principalmente na região sudeste, podendo ser encontrado nos peri-domicílios, em galinheiros, chiqueiros, canis, paióis e também no intra-domicílio, praças e jardins em centros urbanos.

Estes insetos são pequenos, medindo cerca de 1 a 3 milímetros de comprimento, possuem o corpo revestido por pêlos e são de coloração castanha ou palha, facilmente reconhecíveis pelo seu comportamento ao voar em pequenos saltos e pousar com asas entreabertas. Estes insetos na fase adulta estão adaptados a diversos ambientes, porém, na fase larvária desenvolvem-se em ambientes terrestres úmidos, ricos em matéria orgânica e de baixa incidência luminosa. Ambos os sexos necessitam de carboidratos como fonte energética e as fêmeas alimentam-se também de sangue para o desenvolvimento dos ovos. Há indícios de que o período de maior transmissão de leishmaniose ocorra durante e logo após a estação chuvosa, quando há um aumento da densidade populacional do inseto.

O ciclo biológico do mosquito se processa no ambiente terrestre e compreende quatro fases de desenvolvimento: ovo, larva (com quatro estágios), pupa e adulto. Após a cópula as fêmeas colocam seus ovos sobre um substrato úmido no solo com alto teor de matéria orgânica, para garantir a alimentação das larvas. Os ovos eclodem geralmente de sete a dez dias após a postura. As larvas alimentam-se vorazmente e desenvolvem-se em média entre vinte e trinta dias, de acordo com as condições do meio ambiente e, em condições adversas, larvas de quarto estágio podem entrar em diapausa, que é a parada do desenvolvimento o que possibilita a resistência até um período favorável ao seu crescimento. Após este período as larvas de quarto estágio transformam-se em pupas, que são mais resistentes às variações de umidade do que os ovos e as larvas. Normalmente, permanecem imóveis e fixas ao substrato pela extremidade posterior. As pupas não se alimentam e tem respiração aérea. O período pupal em condições favoráveis tem duração em média de uma a duas semanas.

O desenvolvimento do ovo ao inseto adulto decorre em um período de aproximadamente trinta a quarenta dias, de acordo com a temperatura. As fêmeas são hematófagas obrigatórias, apresentam hábitos ecléticos podendo realizar o repasto sanguíneo em várias espécies de animais vertebrados, inclusive humanos. Em áreas urbanas o cão é uma das fontes de alimentação do mosquito e a longevidade das fêmeas é estimada em média de vinte dias.

A atividade dos flebotomíneos é crepuscular e noturna. Durante o dia estes insetos ficam em repouso em lugares sombreados e úmidos protegidos do vento e de predadores.

O mosquito é infectado quando as fêmeas ao sugarem o sangue de mamíferos infectados ingerem macrófagos, que são as células parasitadas por formas amastigotas de leishmania. No trato digestivo anterior do mosquito ocorre o rompimento dos macrófagos liberando os parasitos, que se reproduzem por divisão binária e se diferenciam rapidamente em formas flageladas denominadas promastigotas. As formas promastigotas transformam-se em paramastigotas, as quais colonizam o esôfago e a faringe do mosquito vetor, onde permanecem aderidas ao epitélio pelo flagelo, quando se diferenciam em formas infectantes que são denominadas promastigotas metacíclicas. O ciclo do parasito no inseto se completa em torno de 72 horas.

As fêmeas do mosquito, infectadas, ao realizarem um novo repasto sanguíneo em um hospedeiro vertebrado, liberam as formas promastigotas meta- cíclicas juntamente com a saliva. Sob a pele do hospedeiro os parasitos depositados são fagocitados (englobados) por células do sistema mononuclear fagocitário. No interior das células os parasitos diferenciam-se em amastigotas e se multiplicam intensamente até o rompimento das mesmas, ocorrendo sua liberação e conseqüente fagocitose por novos macrófagos em um processo contínuo. Ocorre então a disseminação hematogênica para outros tecidos ricos em células do sistema mononuclear fagocitário, como linfonodos, fígado, baço e medula óssea.

Após a contaminação, o período de incubação até o aparecimento dos sintomas é bastante variável, tanto para o homem quanto para o cão, podendo ir de 10 dias a 24 meses no homem, e de 3 meses a vários anos no cão.

A possibilidade de atuação de outros vetores além do mosquito na transmissão de leishmaniose vem sendo pesquisada. COUTINHO et al (2004), avaliaram a possível atuação do carrapato Rhipicephalus sanguineus, na epidemiologia da leishmaniose. Os autores relatam que foram removidos 39 carrapatos (seis fêmeas, 11 machos e 22 ninfas), de 21 cães sintomáticos para leishmaniose visceral. Seis carrapatos (15,4%), acusaram reação positiva pelo método PCR para parasitos do gênero leishmania. Para se avaliar a capacidade infectiva dos parasitos encontrados em carrapatos, um macerado destes em solução salina e penicilina/estreptomicina foi inoculado via intra peritoneal e via oral em hamsters. Seis meses após a inoculação, os hamsters foram necropsiados e submetidos a avaliação sorológica. Observou-se que a inoculação do preparado a partir de carrapatos foi eficiente em contaminar 41,2% dos hamsters, sendo mais significante a via intra peritoneal.

O exame sorológico RIFI nos cães variou de 1:40 a 1:40.960, sendo que um único cão que não contaminou os hamsters foi o que apresentou titulação de 1:40.

            Os pesquisadores sugerem, ao final, que a capacidade vetorial do R. sanguineos seja avaliada mais aprofundadamente.

Questiona-se a participação de outros vetores na transmissão de leishmaniose devido ao fato de haver uma interação entre o mosquito e as leishmanias, ou seja, há todo um ciclo e interações entre parasita e vetor até que as formas contaminantes possam ser injetadas pela saliva no hospedeiro mamífero. Os próprios hábitos alimentares dos carrapatos dificultariam a transmissão uma vez que as fêmeas, após fixarem-se à pele do cão sugam o sangue até o ingurgitamento, para a seguir, abandonarem o animal, desovarem e morrerem, ou seja, diferem do hábito das fêmeas da lutzomyia que fazem muitos repastos durante seu ciclo de vida.

Segundo (CARDOSO e CABRAL 2000), há pelo menos duas razões pelas quais os flebotomíneos e não os artropodes são os vetores da leishmania. O meio intestinal do vetor é necessário para uma parte do ciclo do parasita, e certos componentes da saliva do vetor favorecem o desenvolvimento das lesões provocadas por l eishmania. Investigações sobre estratos de glândulas salivares de L. longipalpis identificaram um peptídeo denominado "maxadilan", que é um potente vasodilatador e que potencia a infecciosidade dos promastigotas no hospedeiro.

PECKVOVA (2005), sugere que a sobrevivência da leishmania dentro do flebótomo (inseto vetor), é mediada por fatores moleculares da superfície da leishmania e do epitélio do intestino do inseto. Estes fatores moleculares seriam um tipo de reconhecimento entre a leishmania e o flebótomo. Em pesquisa à função destes receptores, os autores concluíram que a ligação da O – glicoproteína das leishmanias ao intestino do vetor impedem que as mesmas sejam expulsas durante a defecação do vetor, permitindo que completem o ciclo.

Da mesma forma, ROGERS e BATES (2005) postulam que existe uma interação entre o vetor e o parasito, através de um gel proteofosfoglicano secretado pelos parasitos, e que evitaria a saída dos mesmos pela saliva durante algum repasto, antes de haver completado o ciclo.

O mecanismo de transmissão de leishmania pela picada do inseto tem sido motivo de pesquisas e debates. BATES et al (2005), sugerem a caracterização de um estágio específico da leishmania, a forma promastigota metacíclica, e as propriedades da saliva do inseto vetor. Além disto, existiria a produção de um gel pelas formas promastigotas (PSG) durante seu desenvolvimento no vetor. A função deste gel seria proteger os parasitos durante os períodos de alimentação do vetor, e também auxiliar no processo de infecção no mamífero, visto que o gel acompanha a eliminação das formas infectantes durante a picada do inseto.

Os casos de leishmaniose canina NOLI (1999), diagnosticados em zonas não endêmicas, são usualmente encontrados em animais provenientes de áreas endêmicas, ou que tenham vivido nestas áreas por algum tempo. Ocasionalmente, a literatura cita casos autóctones em paises onde não há flebotómos. Nestes casos, os animais nasceram em paises não endêmicos e tiveram contato com animais infectados, o que sugeriria a existência de um inseto vetor alternativo.

Na região metropolitana de Belo Horizonte e de modo semelhante em outros centros urbanos a leishmaniose expande-se rapidamente devido à adaptação do mosquito e à ausência de programas oficiais de controle populacional de cães.

Alem disto, o próprio ser humano contaminado pode ser fonte de parasitas para o mosquito. Segundo PALATINIK et al (2001) em um grupo de humanos portadores de leishmaniose, 28,5% foram aptos a infectar mosquitos e 75% dos cães portadores também infectaram mosquitos.

Assim sendo, a literatura nos oferece grandes conhecimentos sobre a doença, mecanismo de transmissão e biologia do vetor, devendo estes dados serem utilizados no estudo das metodologias de controle. Muitas questões ainda são colocadas, inclusive sobre o papel do cão na incidência humana e os efeitos de sua retirada em diferentes condições sociais.

Será necessário um consenso entre todos os profissionais da área de saúde publica objetivando melhor controle da doença.
 

5 . Utilização da pirazolopirimidina (alopurinol) no tratamento da leishmaniose visceral

Segundo a literatura, o alopurinol inibe o crescimento das leishimanias in vitro, por bloqueio da síntese de RNA ( Liste e Gascon, 1995).

            O alopurinol é um análogo hipoxantina. As leishimanias não são capazes de sintetizar purinas e têm que utilizar as moléculas do hospedeiro. O alopurinol se incorpora no RNA do parasito e altera o metabolismo de proteínas, induzindo síntese de proteínas defeituosas. Como os mamíferos são capazes de sintetizar purinas, este medicamento possui pouca toxicidade para estas espécies.

O alopurinol possui um efeito parasitostático, sendo melhor utilizado quando combinado com outros medicamentos como o antinoniato de meglumina ou anfotericina B, para potencializar o efeito e obter períodos de remissão mais longos. Existem poucas descrições sobre o uso com êxito do alopurinol usado como único tratamento.

            Liste e Gascon (1995), descrevem a utilização do alopurinol (zyloric®; wellcome) como único medicamento no tratamento de um cocker spaniel, 3 anos, IFI 1/160 para Leishmania infantum. A confirmação do diagnóstico foi feita por punção da crista ilíaca e visualização das formas amastigotas. O cão apresentava quadro de anorexia e fraqueza por duas semanas. Os exames hematológicos e bioquímicos mostraram pancitopenia, hiperproteinemia, sinais de falência renal. A eletroforese mostrou hipoalbuminemia e aumento de gama globulinas. Foi utilizado o alopurinol na dose de 10 mg/kg/dia e o animal recebeu dieta específica   para preservar a função renal. O cão foi examinado 30 dias após o inicio do tratamento mostrando recuperação clínica. As proteínas totais séricas continuaram altas, porém a taxa de globulinas tendia à normalização. A taxa de creatina no sangue reduziu 40% comparada ao pré-tratamento e a taxa de uréia reduziu em 30%, não se encontrou pancitopenia após o tratamento com alopurinol, mas o cão permanecia discretamente anêmico. Segundo os autores, apesar do alopurinol ter melhorado a qualidade de vida do cão, os títulos de anticorpos pela imunofluorescência permaneceram positivos após o tratamento e conclui-se que o alopurinol é ineficiente para curar a leishmaniose canina e que novos estudos seriam necessários.

            Os autores não citam a realização de exames parasitológicos após o tratamento de 30 dias.

            LESTER e KENYON (1996) citam a utilização do alopurinol como único tratamento para um cão, diagnosticado portador de leishmaniose através do histórico, sinais clínicos e identificação de amastigotas em biópsia de pele. O alopurinol foi administrado por nove meses, e durante este tempo, houve remissão dos sinais clínicos da doença. Os exames laboratoriais estavam normalizados doze meses após o diagnóstico, e ainda três meses após o tratamento. O cão manteve-se sem sinais clínicos no acompanhamento dezenove meses após a suspensão da medicação.

            Os autores não relatam exames parasitológicos no decorrer do tratamento, fazendo atenção ao aspecto clínico.

            O uso do alopurinol para a manutenção em remissão de cães com leishmaniose é descrito por GINEL et al (1998). É fato conhecido na literatura científica, que os tratamentos com leishmanicidas não proporcionam um controle a longo prazo da doença e o retorno aos sinais clínicos é frequente. Neste estudo, utilizou-se com sucesso o alopurinol na manutenção de cães tratados com antimonial (100 mg/kg/dia), e alopurinol (30 mg/kg/dia). Uma vez obtida a cura clinica, os cães foram mantidos com alopurinol (20 mg/ kg dia) administrado durante uma semana de cada mês. Os resultados foram comparados com um grupo controle de cães onde apenas a indução foi realizada, ou seja, não houve a manutenção com alopurinol. Observou-se recaída em 86% desses cães do grupo controle nos 14 meses após o tratamento, enquanto o grupo que recebeu o tratamento intermitente permaneceu em remissão clinica por um período de até 44 meses; tendo sido observado também um decréscimo no número de anticorpos e ausência de efeitos colaterais atribuíveis ao medicamento; além disto, o tratamento foi bem aceito pelos proprietários. Os autores concluíram que o alopurinol é um meio efetivo para a manutenção da remissão clinica dos cães com leishmaniose.

            Os pesquisadores não fazem referência a análises parasitológicas ou exames mais específicos do tipo moleculares, atendo-se ao aspecto clínico.

            Um outro trabalho evidenciando a ação do alopurinol sobre o cão portador de leishmaniose foi publicado por KOUTINAS et al (2001), onde o produto foi utilizado em 45 cães não urêmicos, com sintomatologia para leishmaniose, imunofluorescência indireta positiva e também PCR positivo em amostras de medula óssea. Um grupo recebeu alopurinol 10 mg /kg duas vezes ao dia e o outro recebeu placebo. O tratamento se estendeu por quatro meses consecutivos. Três animais do grupo alopurinol e um do grupo placebo tiveram óbito no inicio do tratamento, e os outros cães foram avaliados a cada trinta dias e além do exame clínico procedeu-se o hemograma, perfil bioquímico, urinálise e exames parasitológicos de linfonodo e medula óssea. Os animais que receberam o Alopurinol mostraram significante melhora no aspecto clínico quanto à remissão de conjuntivite, linfadenopatia periférica, esplenomegalia, atrofia de músculos mastigatórios, estomatite ulcerativa, epistaxe, dermatite esfoliativa, ulcerações cutâneas, blefarite e hiperqueratose naso-digital. Além da melhora nos sinais clínicos acima, houve alterações significativas e favoráveis quanto à anemia, linfopenia, hiperproteineimia, hiperglobulinemia, hiperfosfatemia e redução na relação albumina / globulina. O grupo que recebeu o placebo não mostrou nenhum tipo de melhora clínica ou nos exames laboratoriais. Os autores observaram significante queda no número de parasitas nos linfonodos e medula óssea. Apesar de o Alopurinol haver promovido melhora nas anormalidades clínico - patológicas, o medicamento não foi capaz de eliminar totalmente as leishmanias dos cães, verificando-se positividade do PCR da medula em todos os animais após o tratamento.

            A cura clínica de cães tratados com Alopurinol pode se estender por muitos meses e até por dois anos como relatam CAVALIERO et al (1999). Foram observados dez cães tratados com Alopurinol 10 mg/dia por períodos que variaram de dois a vinte e quatro meses. Nove cães que foram tratados por dois a seis meses não tiveram recaídas clínicas por tempo superior a vinte meses. Parasitos foram detectados em oito dos nove cães após o desaparecimento dos sintomas, através de cultivo in vitro ou PCR em aspirados de linfonodos. Em quatro destes cães, parasitos foram também detectados por PCR em amostras de sangue. Assim sendo, os autores concluem que o Alopurinol isoladamente, promove a cura clínica porém os cães   podem permanecer como reservatórios em áreas endêmicas.

            A recuperação clínica do cão com administração do Alopurinol é também acompanhada por mudanças nos níveis de anticorpos séricos, como descrito por VERCAMMEN e DEKEN (1996). Os autores avaliaram a cinética de anticorpos em onze cães tratados com Alopurinol 5 mg kg 3 x ao dia, por períodos de tempo que variaram de um a quatorze meses. Houve diferença significativa nos títulos de RIFI em todos os animais tratados (diminuição), sendo que em dois animais a sorologia apresentou-se negativa. Os autores citam não ter havido correlação entre a sorologia inicial e sintomatologia clínica observada nos cães do estudo; porém, acreditam que a sorologia através de RIFI (Reação de Imunoflorescência Indireta) pode ser usada na avaliação da evolução da leishmaniose canina, uma vez que a recuperação clínica era acompanhada pelo decréscimo dos níveis de anticorpos.

            A utilização do Alopurinol como único tratamento, apesar de preservar a qualidade de vida do cão tem suas implicações sociais. Em regiões endêmicas e onde há o risco de transmissão, sua utilização isoladamente é desaconselhada. Em países não endêmicos, o medicamento é descrito como de "eficácia terapêutica suficiente" segundo trabalho publicado por GOTHE et al, (1997), na Alemanha. Segundo estes autores, entre 1993 e 1995 foi detectada a doença em 132 cães. Os estudos epidemiológicos revelaram que estes cães viajaram por áreas endêmicas com seus proprietários ou foram adquiridos de países como Espanha, França, Itália, Turquia e Portugal.

            Devido ao fato de não haver citação a respeito de cura parasitológica, o uso do Alopurinol como tratamento primário é desaconselhado em países como o Brasil. Porém, há um consenso na literatura quanto à benéfica atuação do medicamento como adjuvante durante o tratamento e na manutenção em remissão por períodos longos de tempo. O acompanhamento após o tratamento envolve, além de avaliações clínicas, avaliações quanto ao aspecto parasitológico, principalmente quanto ao parasitismo cutâneo e à parasitemia, como descrito a seguir.

            Obs: informações sobre a utilização do Alopurinol na leishmaniose canina encontram-se na seção "sugestões de literatura".

6. Utilização do sulfato de aminosidina e associações no tratamento da leishmaniose visceral


O sulfato de aminosidina, também conhecido como paromomicina é um aminoglicosídeo do grupo da neomicina com amplo espectro antimicrobiano, principalmente contra bactérias gram negativas, Staphilococcus, e alguns protozoários como Entamoeba histolitica, Giargia duodenalis e Balantidium coli. Além disto, a aminosidina tem sido descrita como uma ferramenta no tratamento da leishmaniose. A sua farmacocinética parece ser semelhante a outros aminoglicosídeos, uma vez que possui baixa biodisponibilidade quando administrada por via oral, o que não ocorre quando utilizadas as vias   intramuscular e subcutânea BELLOLI et al (1996).

A farmacocinética da aminosidina não difere significativamente quando utilizada nos caninos, eqüinos e bovinos a não ser pelo fato de sua eliminação ser mais lenta no cão. Esta eliminação lenta no cão é favorável ao se desejar níveis séricos mais prolongados. A sua ação é a mesma seja por via intramuscular ou subcutânea, e devido à sua eliminação no organismo ( meia vida plasmática em torno de 2 horas), a droga pode ser administrada duas a três vezes ao dia havendo risco de toxicidade renal e no sistema otovestibular. Pesquisas mais recentes sugerem que a dose única ao dia permite atividade bacteriostática mesmo quando o medicamento atinge níveis baixos no sangue, havendo menos toxicidade BELLOLI et al, (1996).

BELLOLI et al (1995) descrevem a utilização de aminosidina e antimonial para o tratamento da leishmaniose em cães. A aminosidina não mostra grandes alterações nas suas concentrações séricas quando administrada sozinha ou juntamente com o composto antimonial, porém, as concentrações e tempo de duração do antimonial variam. As concentrações séricas do antimonial permanecem altas por maior tempo quando utilizadas com aminosidina, ou seja, têm sua ação potencializada. Os autores consideram que a aminosidina interfere com o transporte de cálcio (Ca ++), modificando a permeabilidade da membrana celular, assim retardando o transporte do antimônio através das membranas celulares. O ciclo biológico da leishmania é caracterizado por curtos períodos extra celulares e longas fases de replicação nos macrófagos. Uma vez que os antimoniais pentavalentes podem ser pobremente transportados dentro das células, obter uma concentração sérica constante seria mais efetivo do que concentrações flutuantes. O possível efeito da aminosidina na disponibilidade do cálcio intracelular poderia influenciar na "aderência" das promastigotas e amastigotas nas membranas dos macrófagos e modificar a resposta destas células aos parasitos. Assim, um dos efeitos da aminosidina seria impedir a entrada dos parasitos na célula e deixá-los expostos à ação dos antimoniais. Os pesquisadores ressaltam que freqüentemente, cães com leishmaniose sofrem algum grau de acometimento renal e como os antimoniais e aminoglicosídeos são excretados por esta via, a função renal deve ser cuidadosamente monitorada.

FAYET (2000), também relata que a utilização da aminosidina em combinação com o antimonial é efetiva no tratamento da leishmaniose resistente em estudos na Índia e no Quênia.

VEXENAT et al (1998) relatam a utilização de aminosidina no tratamento de leishmaniose canina, com resultados desde a cura parasitológica por 4 anos e recaídas entre 50 e 100 dias após tratamento, sugerindo a utilização desta droga em combinação com outras para melhores resultados, bem como medidas de suporte visando evitar efeitos colaterais.

POLI et al (1997), avaliaram clinicamente a utilização de aminosidina em 12 cães naturalmente infectados com l eishmania. A hipergamaglobulinemia devido à proliferação de linfócitos B é evidente em cães infectados e pode ser responsável pelos imunocomplexos circulantes e suas lesões. A eficácia do tratamento foi avaliada através da resposta clínica obtida e do monitoramento de proteínas séricas, imunoglobulinas e imunocomplexos. Os autores obtiveram significativa taxa de cura clínica com alguns cães se tornando soronegativos. Aminosidina também foi eficiente em diminuir imunocomplexos circulantes que desempenham importante papel na patogênese da doença. Relatou-se que a oto e nefrotoxicidade devem ser consideradas, principalmente em cães com lesões renais pré-existentes.

Um estudo comparativo entre a utilização de aminosidina e do antimonial foi publicada por Poli et al (1997) no Veterinary Parasitology. Descrevem os autores a utilização de cada droga em 12 cães naturalmente infectados. Onze dos 12 cães submetidos ao tratamento com aminosidina apresentaram marcante decréscimo no nível de anticorpos, redução na proteinúria, diminuição na taxa sérica de IgG bem como nos imunocomplexos circulantes. Os pesquisadores concluíram que a aminosidina é tolerável e segura para o tratamento da leishmaniose canina, podendo ser usada como substituto para terapia com antimonial.

PERSECHINO et al (1995), utilizaram a aminosidina no tratamento de 40 cães entre 1 e 12 anos de idade. Os animais estavam positivos na RIFI, entre 1:80 e 1:5120, e a confirmação do diagnóstico foi feita através da visualização do parasito em aspirados de medula óssea e linfonodos. Os autores encontraram 86% de eficácia considerada boa, em uma escala que variava entre escassa, boa e discreta. Foram observados efeitos colaterais a nível otológico (4,9%) e renal (6,1%), mas apesar disto 27% dos animais tratados mostraram aumento de fração albumínica e redução de fração globulínica, o que se mostra favorável tanto para a recuperação clínica quanto para a questão parasitológica.

A importância da relação albumina/globulina também é relatada por pesquisadores brasileiros como RIBEIRO et al (2005). Uma vez que o cão pode guardar grande quantidade de parasitos na pele seria necessário identificar os cães potencialmente infectivos através da demonstração dos parasitos, o que pode ser feito através de dois exames: Xenodiagnóstico e imunohistoquímica. No trabalho apresentado os valores da fração albumina/globulina em 191 cães naturalmente infectados foram mensurados bem como feitas análises imunohistoquímicas da pele da orelha. Os valores albumina/globulina foram cruzados com os resultados obtidos na pele. Os cães que mostraram mais formas amastigotas na pele tinham os menores valores da fração albumina/globulina o que levou os pesquisadores a sugerirem que este dado pode ser indicador da infectividade dos cães naturalmente infectados por L. chagasi.

CASTRO et al (1995), descrevem a utilização da aminosidina em um paciente humano cuja leishmaniose apresentou-se refratária ao antimonial pentavalente. O paciente, de 14 anos, recebeu 10 séries de tratamento com antimonial entre 1987 a 1991 e obstante, apresentava-se caquético, febril, anêmico, dispnéico, com sangramento nasal e gengival, otite media, septonasal perfurado. Laboratorialmente observava-se leucopenia com neutropenia, plaquetopenia e disproteinemia. A punção esplênica após o tratamento com antimonial mostrou mais de 50 amastigotas por campo. Após aprovação do conselho de ética do hospital, administrou-se 20 mg\Kg\dia, sendo o efeito colateral mais notado a dor no local das injeções. Logo após o primeiro tratamento a punção esplênica mostrou 10 amastigotas por campo e o inoculado em hamster foi positivo. Vinte dias após o primeiro tratamento, foi repetida nova série na mesma dosagem. Após 2 anos de acompanhamento o paciente foi considerado curado segundo parâmetros hematológicos e parasitológicos.

JHA TK (2005), citou a aminosidina como uma droga segura, efetiva e de baixo custo para o tratamento da leishmaniose visceral. O estudo foi realizado na província de Bihar na Índia, a onde acontece o maior número de casos de leishmaniose mundial, e os resultados mostraram que a aminosidina na dose de 15 mg\Kg\dia, por 21 dias é segura e efetiva para o tratamento da doença.

O uso da aminosidina também foi descrito no último congresso mundial de leishmaniose em 700 pacientes africanos pelos pesquisadores ROYCE & WASUNNA (2005), que sugerem a criação de uma estratégia global para utilização deste fármaco, isolado ou em combinação com antimonial em tratamentos mais curtos.

TK SINHA et al (2005), também publicara um trabalho onde apontou-se a eficiência da utilização de aminosidina como segura e eficiente para a cura da leishmaniose em pacientes pediátricos na Índia.

No Brasil, em 2005, houve uma ação judicial movida por um órgão de saúde pública contra uma proprietária, cujo cão portador de leishmaniose estava sendo tratado com aminosidina e medicação de suporte. A ação judicial desenvolveu-se com laudo pericial e audiências onde foram apresentados resultados de exames que apontavam para a eficácia do tratamento tais como exames parasitológicos de pele, PCR e exames sorológicos. A sentença judicial foi favorável à preservação da vida do cão e abriu um precedente histórico no país. A cópia deste processo encontra-se, na íntegra na parte "anexos" desta revisão de literatura.

Uma análise comparativa da utilização de anfotericina B e aminosidina foi descrita por SUNDAR no terceiro congresso mundial de leishmaniose, Itália, 2005. O estudo foi realizado em locais onde ocorre alta taxa de resistência ao antimonial. Nos pacientes avaliados, a aminosidina promoveu 94,6% de cura enquanto a anfotericina B obteve a taxa de sucesso de 98,8%. A aminosidina teve como efeitos colaterais, dor no local da aplicação em 55% dos pacientes, baixa nefrotoxicidade e 0,6% de ototoxicidade reversível.

Dispomos de vasta literatura à respeito da aminosidina. OLIVA et al (1998), descrevem a utilização da aminosidina, antimonial e associação das duas drogas no tratamento de 32 cães naturalmente infectados por Leishmania infantum. Foram analisados parâmetros clínicos e laboratoriais aos 21 dias pós tratamento e também após dois, quatro e seis meses. Observou-se que a combinação das drogas obteve melhor escore em eficácia clínica, menor incidência em recidivas, redução da densidade dos parasitos na medula óssea e aspirado de linfonodos.

Como em outras drogas a resistência das leishmanias à aminosidina é descrita na literatura, como citado por MAROUF et al (1998), onde parece haver uma inativação enzimática da droga. Os estudos foram realizados in vitro e in vivo em ratos. Sugeriu-se através dos resultados, que a aminosidina entra rapidamente nas células através de transporte ativo, mas, uma vez estabelecida a resistência, o medicamento passa a entrar lentamente na célula por difusão. O fato ocorreria por alterações no padrão genético dos parasitos.

A literatura pertinente ao tema, nos permite concluir que a aminosidina é uma ferramenta útil no controle da leishmaniose canina. Durante longo período de tempo, drogas mais eficazes como os antimoniais e a anfotericina B foram de primeira escolha, entretanto com o aparecimento de cepas resistentes a estes medicamentos, a aminosidina voltou a ter seu lugar de destaque tanto em humanos como em cães. O aparecimento de cepas resistentes é fato que provavelmente acontecerá em todas as drogas, assim deve-se ter cuidado ao conduzir os tratamentos, com protocolos bem estabelecidos e retardem o aparecimento do problema. A literatura internacional indica que a combinação de drogas ou a alternância delas seria benéfica no controle geral da doença, com esforço no sentido do aproveitamento máximo de um medicamento e de se evitar e disseminação de cepas resistentes. Mais detalhes são descritos na sessão "resistência à drogas leishmanicidas." 

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